O Crime ABC
Arte final; um tiro.
O tamborilar frio dos 5 dedos na mesa
E o maxilar deslocado pelo soco da idéia abortada -
Sangue.
O lixo entupido de papéis riscados e amassados e mortos.
A narina de quem quer produzir e não consegue
entupida de papéis jogados fora descarga abaixo -
Bandido.
A boca torta e deformada
daquele que viu tudo de longe e não consegue falar o retrato,
mas desenha o lugar.
A polícia inicia a busca do cativeiro
Das vítimas da mente de quem pensa demais.
Chuva na cara de quem não sente nada,
Mas devia sentir -
Foragido.
Procura-se o dono do espirro
no lencinho de papel
Que entupiu a pia da casa
e matou as idéias afogadas
No lodo.
Rastro das pegadas na grama do jardim secreto.
A cena do crime.
A perícia se aproxima e examina o cadáver de olhos abertos -
Gelado.
O laudo confirma o estrangulamento e duas balas certeiras
No peito do papel.
ASSASSINO! -
gritou um velho pela janela ao ver a reportagem no jornal das oito,
Enquanto as possibilidades pulavam aflitas
na cama elástica de quem pensa demais.
As fotos das idéias mortas vazaram pela internet,
Comovendo e chocando a sociedade boquiaberta:
A passeata pela paz vai ser domingo, na orla.
Estado de sítio em que todos com caneta e papel eram suspeitos
de integrar a máfia
da chacina das pobres idéias indefesas e órfãs.
O luto e a dor da perda,
Rezando para que seus espíritos subam em paz,
E reencarnem em novas formas
Como todas as idéias fazem
Quando são abortadas antes de serem passadas adiante,
E, só então, se tornarem imortais.
A esperança de dias melhores
assoprava a cara de quem sentia tudo,
mas não devia sentir.
Enquanto isso, um homem bandido, procurado, ameaçado e foragido
Aproveitava um dia perfeito de Sol na Grécia
Com caneta e papel no bolso.
E com uma cicatriz estranhamente bonita no maxilar.