sexta-feira, 24 de agosto de 2007

anota meu telefone novo

anota meu telefone novo que o velho deu defeito. eu tentei deixar uma mensagem na sua caixa postal, mas você não me respondeu até hoje. assim, não tô querendo que você me ligue logo, mas já se passaram muitos dias, né, estranhei... não que eu precise falar urgente com você, não não não, mas eu só estranhei você não ter me ligado, só isso, tranquilo.
comigo tá tudo ótimo, estou muito bem e tal e coisa. e com você? espero que esteja bem e não esteja com nenhum problema pra não estar respondendo o celular.
se você ler isso aqui, anota meu telefone novo e, bem, me liga, se der, se você puder.

ah, à propósito, estou solteiro de novo.

segunda-feira, 20 de agosto de 2007

Hang Loose

Acho que só quem pega onda sabe o que é viver.
A gente espera o dia todo pelo drop perfeito e depois daquele caldo cabuloso, bróder, sempre vale a pena madrugar pro trabalho.
Esse é o meu trabalho, irmão, eu tenho o surf na veia.

Desde que nasci não larguei mais o mar.
E os primeiros passos foram na prancha, aloha, remando.
A rotina que eu quero ter pra sempre:
O movimento das ondas, que tão sempre mudando, nenhuma é igual a outra, as manobras, a harmonia...
E depois arranhar um sonzinho na viola, na fogueira, com a galera reunida.
celebrando mais um dia de surf... e de larica!
Pela parte que me faz querer sempre estar no deck,
É tudo perfeito,
É tudo sagrado.

Na hora da trip, não dá pra ser merrequeiro.
Aquele surf hot dog pipoca de maluco cabrero.
Não curto muito paraibada,
aquele bando de jaca na praia.
Tem que ter amor pra estar no rip, pra viver de onda.
É só amor o bagulho.
E eu tenho, ah, eu tenho.

Irmão, eu amo tanto essa parada que nem sei explicar,
É tudo onda, o bagulho todo é onda, a vida é onda...!
E até depois de uns storms, sempre rolam perrengues, o fundo sempre se ajeita.
Se tu não tá entendendo nada, vem pra linha de rebentação.
Porque só quem pegou onda sabe o que é viver,
E, olha, tenho um notícia boa pra tu:
A prancha pode quebrar... tu pode tomar uma vaca... até morrer tu pode...!
Mas enquanto o mundo for mundo,
ah mané,
As ondas nunca vão acabar.

domingo, 19 de agosto de 2007

o arrepio de quem sente que faz diferença no mundo

Quando todo mundo começou a me aplaudir senti o arrepio de quem sente que faz diferença no mundo. Levantei, me abraçaram, me fotografaram e eu já sabia. Eu já sabia que uma hora tudo ia cair.
Em dois meses, tinha olheiras e claros sinais do mal que aquele prêmio me fez - não era isso que você queria? Eu não passei. Eu não passei no teste, eu fui reprovado por quatro pontos e setenta e cinco décimos no teste que eu me preparei a vida toda pra fazer. E de que adianta uma merda de um prêmio agora? Agora eu não quero mais esse prêmio, pode ficar com ele, pode ir com ele para o inferno.
Você não reparou que ninguém mais levanta o dedo pra perguntar? Todo mundo sai perguntando, interrompe, tudo zuado. É por isso que é melhor não perguntar, mas a solidão vicia, mané. Pelo menos, me viciou.
Me viciou em não perguntar, mas não porque eu tenho medo de parecer burro (que coisa mais ridícula de pensar, somos todos uns asnos, no fundo, no fundo), e sim porque eu tenho as respostas. Você tem as respostas também.
Eu só não as encontrei na hora da prova porque eu fui um asno em pensar que "uma hora tudo ia cair", e, claro, caiu. A gente vive se botando pra baixo porque é mais fácil viver de esmola, mas a piedade e pena são os sentimentos mais ridículos do mundo. Ninguém consegue se construir em decepções, elas não fazem você crescer, nem vão de mostrar nenhuma merda de prêmio agora, nem mais depois. Por que não se construir de vitórias?
Como nós somos frágeis... E como nós somos mais burros ainda em pensar que somos frágeis!
Eu não passei, as olheiras não sumiram, eu não passei e eu já sabia. Eu já sabia que ia amarelar de te dar aquele prêmio, ele é meu, cara! Você pode roubá-lo, se quiser, mas tenho certeza que nunca vai saber como é sentir o arrepio de quem sente que faz a diferença no mundo.
E por mais que eu não tenha passado, heh, eu continuo e acho que sempre vou continuar arrepiado.

sexta-feira, 17 de agosto de 2007

fração (ou simplesmente certeza)

Não sou amigo pras horas tristes,
guarde elas pra você,
afinal,
elas não existem
pra mim,
não sei pra você...
Eu não falo por você,
falo por mim.
E eu sei o que eu quero.
O que eu não quero eu esqueço
assim como esqueci o que você me disse
sobre aquelas horas tristes...
E se quer saber:
é melhor parar de dizer
porque eu vou sempre esquecer.
Eu não falo por mim,
falo por você
porque quanto mais se coça mais se quer coçar mais.
Então se você quiser seu meu amigo
deixa eu coçar o teus sorrisos
guarde eles para mim,
afinal,
Eu sei o que eu quero.

segunda-feira, 13 de agosto de 2007

Ídolos

A luz vermelha escondia a dança afrobeat em que os braços eram pernas cortando o tablado de areia.
"Seja bem-vindo ao maior espetáculo da terra", disse um homem sem rosto, como todos do outro lado... como você - espectador que não lê isso por mero acaso, foi o destino que te trouxe aqui.
E as pernas, em passos largos, se espalhavam pela platéia que esperneava só de pensar que as pegadas no tapete vermelho eram pegadas do lado do seu coração.
"Aqui os sonhos acontecem porque é só acreditar", disse ele passando as unhas pelo corpo, enquanto a platéia via as pernas agachadas sobre o chão-de-milho: a salvação não parecia arranhar. Você tem unhas?
O esmalte afastava o tun-ti-tun daquela canção majestosa, que seduzia a platéia pela púbis com um tesão negativo. Então, quando o homem sem rosto resolveu limpar a maquiagem do seu olho-de-vidro, puxou a lâmpada vermelha debaixo de seu terno.
"Tudo se revela pela luz, tudo se revela pela luz".
E em menos de um segundo, as pessoas começaram a se levantar e se aproximar e se aproximar. Não dava pra acreditar - era muita beleza pra um só lugar!
Batucando o chão como um tambor de pele-de-gato, as pernas ao redor convidavam a entrar na roda que acorda, todo mundo queria ver mais de perto essa tal luz que fazia o mundo girar.
"VENHAM TODOS, VENHAM VER", e o redemoinho de areia subiu poeira pelos olhos do povo ao redor, espremido naquele tablado, tentando respirar o pó que vinha da vida em movimento.
E o volume aumentava, e a luz cegava quem chegava perto, e as pernas dançavam, e o homem-sem-rosto gritava e gritava e os curiosos queriam se revelar, queriam se aproximar e deixar a luz os guiar.
"Mas não pode tocar", impôs o homem-sem-rosto em vão. No mesmo momento, uma mulher o empurrou e tomou com suas unhas a lâmpada vermelha: "Todos merecem ter a salvação!!!" Gritava ela com a platéia delirante, querendo tocar na luz afrobeat 100% pura.
E num estrondo, a cortina se abriu para um palco maior com dois grandes holofotes bem no meio da cara deles, e, dali, eu pude ver de camarote aquele bando de babacas segurando uma luzinha vermelha e gritando por salvação.
Não deu outra. Em dois segundos, todos transfiguraram-se: as bocas uivavam de dor enquanto os braços viravam pernas que cortavam o tablado de areia e se somavam às pernas antigas, que, por sua vez, pulavam de alegria de ter novos amigos.
Não sei se você viu esse espetáculo patético, mas se lê essa história, foi o destino que te trouxe aqui. Depois de dois anos ainda lembro como se fosse ontem - o homem-sem-rosto se recompôs, foi para o camarim e as pernas o seguiram, procurando respostas e tal luz da vida que a lâmpada fingia dar.
Eu paguei para ver os Ídolos, é tudo entretenimento, não que eu goste de ver braço virando perna, mas é que tava na cara que ia ser furada esse papo de herói. Não sei se você vai acreditar no que eu vou te contar, mas preciso falar de qualquer jeito - eu vi tudo de perto e não toquei na luz vermelha. Eu vi de camarote todo mundo esmilinguindo e o homem-sem-rosto indo embora e os aplausos do outro lado do palco, e o fim da dança afrobeat com todos partindo para seus lares. Eu vi com meus próprios olhos...
E no final, bem no final, cheguei pertinho, subi no tablado, olhei aquela luz que fazia o mundo girar (realmente era bonita), fiquei olhando por dois minutos, dois longos minutos, bem perto, colado, rosto vermelho.
Com um estalo, levantei, pisei naquela merda, e a chutei bem longe, pra que nunca, nunca mais, os Ídolos pudessem desconfiar que, num dia, num remoto dia, pisou ali naquele mesmo palco alguém que conseguiu encontrar a salvação no escuro. Deixa as pernas espenearem...