terça-feira, 18 de julho de 2006

Pinguela

Seria estranho se a água sangrasse por entre as pontes do nosso jardim. Eu, ilha-rasa, podremente flutuava, entre o limbo de uma vida sem pontes para o teu sorriso e para minha verdade.
Seria estranho recontar as toras com esmero depois de tantos cupins falidos que vinham daquele bolor funéreo dos velhos sonhos de garrafa-ao-mar que nunca compartilhamos, boiando em nossas praias pequenas.
Seria estranho perceber que não usamos pregos, mas sim problemas para martelar um amor-chiclete, imaturo, que de tão inseguro, cedia com leves pegadas no cimento molhado pela nossa inocência pueril.
Seria estranho nos comunicarmos com tantos fogos-de-artifício nessas nossas ilhas separadas, de trânsito calmo, e faróis que brilham como neon rarefeito, bem do jeito que os corações desejavam se banhar.

Mas eu só desejava ter mil risos, ter um lar, sem discutir muito sobre como pontes edificar. Achei normal a maré me inundar e já previa que o distante salvar, não estava naquelas pontes tortas que construímos com mãos sujas de terra e limpas de culpa. Ele estava no fogo que nasceu do raio no nosso nome e coração talhados na madeira morta daquele bonsai do nosso jardim.
E aquelas pontes queimaram e eu achei que fosse morrer vendo sua silhueta por entre a fumaça longe, longe da minha ilha, tão mais ilha de novo do que qualquer conjugação do verbo "existir".

E hoje, assim coberto de tanta água, ainda ilha-rasa, nada mais me é estranho - nem aqueles cupins, nem aqueles chicletes, nem aquele neon morto. Apenas as pontes de verdade, aquelas para minha verdade, insistem em não se deixar queimar.

2 Comments:

Anonymous Anônimo said...

ô vini, deixa de pinguela e vamos trabalhar!

5:18 PM  
Anonymous Anônimo said...

Deprimente? Achei maravilhoso!!!

O penúltimo parágrafo está ótimo, ótimo!!!

1:05 AM  

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